NO TEU OLHAR
Erlend Mork , agony print
Nesse rosto adulto
encontro um olhar infantil
e descubro no teu olhar
uma criança a chorar
Luto desesperadamente
tento chegar, entrar, penetrar
agarrar esse teu olhar
Foram carinhos insuficientes
Palavras carentes
Como sofreu essa criança
reflectida no teu olhar...
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ALBUM DE FAMILIA
Das lembranças mais antigas, recordo quase com exactidão o dia da minha primeira fotografia. A minha primeira fotografia que tenho memória, entenda-se.
Recordo a correria e alvoroço em que a minha mãe estava, preocupada em nos vestir as melhores roupas, as roupas domingueiras. Teria aproximadamente os meus cinco anos, por isso não seria muito pesada, pois lembro que minha mãe agarrou-me pelos braços, levantou-me sem grande esforço e sobre uma arca metálica (onde normalmente se guardavam os lençóis bordados e outro tipo de roupa) vestiu-me umas calças escuras com alças, uma camisola branca e como agasalho um bonito casaco de algodão, que me tinha sido oferecido pela minha madrinha de baptismo.
Naquele tempo a casa onde habitávamos tinha um vasto quintal e no meio do mesmo um pequeno carreiro que ligava a casa ao portão da entrada. Todo o percurso desde a entrada até junto das casas, a minha avó vivia logo ao lado, era decorado com flores, várias flores. Recordo que o cenário escolhido para tirar as fotos foi precisamente junto ás margaridas.
Tanto eu como os meus irmãos estávamos completamente brilhantes, penteados e perfumados, com a velha água-de-colónia.
Mais tarde já adolescentes, as fotografias em questão foram alvo de grande discussão familiar, mas essa é outra história. Tanto que ainda hoje fazem parte do meu albúm fotográfico, rasgadas e toscamente coladas….
Mais tarde o meu agasalho, o bonito casaco de algodão oferecido pela madrinha, foi material de costura. Eu passo a explicar. Na minha rua não existiam carros, ou outros veículos motorizados, senão algumas raras bicicletas, que atentassem á segurança das crianças. Na verdade a minha rua, não era propriamente uma rua, mas sim um grande carreiro de terra batida, em tempos idos bastante famosa. Por lá passaram D. Miguel e as suas tropas, quando em
A rua era o nosso mundo, nele brincávamos livremente. Percorria a rua toda com os meus amigos, conhecia como a palma das minhas mãos o interior de todas casas e quase sempre a minha mãe desconhecia onde eu parava. Só aparecia em casa para almoçar ou jantar quando ao longe ouvia a voz de minha mãe.
Numa dessas minhas ausências apareci em casa mas sem o meu casaco, que obviamente deixara abandonado, perdida em mirabolantes brincadeiras. Mas a minha mãe, como sempre alerta, perguntou-me pelo casaco. Após a minha confissão sobre tortura, que o casaco se encontrava em casa da minha amiga Zirinha, a filha da Ti Glória do alto, fui obrigada a recupera-lo.
Ainda sinto o rubor, o calor de embaraço nas faces do rosto, quando de mão agarrada á minha mãe, pergunto pelo casaco. Nisto aparece a Ti Glória que com palavras azedas diz nunca ter visto tal casaco. Bem resumindo a história, já o casaco estava cortado e recortado e as bonecas bem vestidas, tipo novo modelo de casaco de noite….
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TODAS AS MANHÃS DO MUNDO
Todas as manhãs do mundo
pertencem-me
O mundo ...
Casa que habito
nas nuvens prenoito
As montanhas o meu leito
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AFAGO
Choro
Sentindo um eco estranho
Um ruído lá fora
Como se eu estivesse dentro
De repente descubro
As lágrimas não são gotas d'água
São ruídos surdos
São gritos calados, sufocados
Sou uma covarde
Por isso choro silenciosamente
Com receio que me escutem
Os suspiros abafados são alarmes
Não consigo controlar o meu respirar
O medo vibra no meu corpo
Como se um morto me tentasse agarrar
Secaram-se as lágrimas
Cessaram-se os ruídos
Finalmente encontrei um esconderijo
Num afago doce
Quase esquecido
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DIA MUNDIAL DA CRIANÇA
Desenho de CRIANÇA
por Silvia (a minha criança)
As crianças
em toda a sua doçura
são para mim
poesia...poesia pura