O SILÊNCIO
Por momentos ausentei-me de meu corpo e deixei-me levar pela corrente de recordações que pairavam no ar, aguçando, espicaçando a minha imaginação. Percorri com o olhar cada recanto deste lugar. E comecei a imaginar, um qualquer longuinquo Inverno, o frio a entrar, sem ninguém o convidar, penetrando cada pequena ranhura da porta. A luta entre a pequena lareira e o frio que se fazia sentir seria desigual. Ao longe, era possível escutar o vento a uivar, provocando calafrios, arrepios de frio.
Entre outras coisas imaginei a pouca comida, possivelmente servida numa mesa não muito grande, colocada junto á parede. Provavelmente, um caldo bem quente, que aquece, aquece o corpo enregelado, aquece a alma quase fria.
Meu pai tentava encantar minha mãe, com frases como “vais descansar, aqui é calmo, vais ver…”. Senti pena de minha mãe, dos poucos dias em que iria ali repousar, segundo o meu pai, naquele lugar encantado.
Reviver o passado era o objectivo a que se proponha o meu pai e claro, como tudo na vida, ou quase tudo, tencionava partilha-lo com minha mãe. Não terão sido as confissões, ou as conversas, mas os silêncios. Sobretudo os silêncios. O silêncio de uma casa abandonada, outrora cheia de vida. O silêncio de meu pai que tudo absorvia, como que querendo resgatar o passado. O silêncio das noites que partilharam em silêncio...
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TODAS AS MANHÃS DO MUNDO
Todas as manhãs do mundo
pertencem-me
O mundo ...
Casa que habito
nas nuvens prenoito
As montanhas o meu leito
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A CASINHA
A casa da Senhora Ermelinda, na qual foram instalados o meu pai e a minha mãe, naquelas férias, espantou-me completamente. Era pequena, não tinha luz eléctrica e não tinha água (o que os obrigava a pedir aos vizinhos a quantidade de água que necessitavam)
Espantou-me e levou-me a pensar como era possível que em pleno século XX, a caminho do século XXI, encontrar uma casinha em estado quase primitivo. Foi-me explicado pelo meu pai que a Senhora D. Ermelinda não fazia uso da casa há muito tempo. Vivia junto com uma filha.
Espantou-me porque não queria entender o porquê daquele desejo do meu pai em passar férias na terra que não era dele, dele eram as poucas lembranças que guardava no mais recôndito da sua memória, numa casinha que mais parecia retirada dos livros de contos de fadas que eu em menina devorava.
Entrar naquela casinha foi como se tivesse recuado no tempo, no tempo que não era o meu, no espaço que identifiquei como sendo a pequena casa em que meu pai viveu.
O chão da cozinha era castanho, castanho-escuro da cor de terra, terra pisada por pés calejados, castigados por árduos dias de trabalho, pés nus de crianças clamando o pão.
Na cozinha não tinha qualquer tipo de electrodoméstico, muito menos um fogão, para grande espanto de minha mãe. Num dos quantos tinha uma pequena e rudimentar lareira maltratada pelo tempo.
Os quartos eram dois e estavam equipados com duas modestas camas de ferro, já um pouco enferrujadas. Sobre as camas caíam colchas de lã de cores garridas e vivas contrastando com o ar sombrio e abandonado da casa.
E o meu pai tudo olhava maravilhado...
Encantado por encontrar a casinha no estado original…
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D. ERMELINDA
A senhora Ermelinda tinha nesta altura aproximadamente uns oitenta e poucos anos. Uma aldeã tipicamente portuguesa. Toda vestida de negro, a saia coberta pelo avental, imaculadamente limpo. O cabelo, preso por um lenço, adivinhava-se completamente branco. Sulcos traçados pelo tempo em volta de uns olhos azuis e um magnifico sorriso pintado no rosto.
Foi meu pai que quase me forçou, isto é, fez questão absoluta em me apresentar a simpática senhora.
Percebi naquele dia que ela representava para ele as raízes que não tivera, da terra que não o quis, a avó que não conheceu, a mãe cujo rosto se desvaneceu na memória de criança abandonada.
Percebi não naquele dia, mas a pouco e pouco, o porquê da revolta constante com que meu pai enfrentava o mundo. A agressividade com que pronunciava as palavras, a forma como caminhava. Quase correndo para o alcançar, nunca me cansava de o acompanhar quando ainda menina para todo o lado o seguia.
Interrogava-me, se aquele andar apressado era uma forma de fugir do passado, um passado carregado de memórias atrozes ou se corria agarrando o futuro, um futuro que desenhou firmemente, traçando a linha da sua vida.
(cont.)
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CAMINHOS
Gostava de percorrer
caminhos que desconheço
Desbravar
trilhos inacessíveis
Caminhar
ao som do silencio
Sentir
a terra respirar
Acariciar
ternamente o solo
com meus pés
dançantes
E bailar, bailar…
Até o meu corpo
libertar
em êxtase total
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ARTE EM FAMILIA
Quadro pintado a oleo de
José Teixeira Alves
Quadro pintado a oleo de
Silvia Gomes Alves
Quadro pintado a aguarela de
Inês Gomes Alves
Folha escrita a tinta negra de
Teresa
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PEDRA FILOSOFAL
Um bonito poema numa linda melodia espectacularmente interpretado por Manuel Freire...
Pedra Filosofal
Eles não sabem que o sonho
é uma constante da vida
tão concreta e definida
como outra coisa qualquer,
como esta pedra cinzenta
em que me sento e descanso,
como este ribeiro manso
em serenos sobressaltos,
como estes pinheiros altos
que em verde e oiro se agitam,
como estas aves que gritam
em bebedeiras de azul.
eles não sabem que o sonho
é vinho, é espuma, é fermento,
bichinho álacre e sedento,
de focinho pontiagudo,
que fossa através de tudo
num perpétuo movimento.
Eles não sabem que o sonho
é tela, é cor, é pincel,
base, fuste, capitel,
arco em ogiva, vitral,
pináculo de catedral,
contraponto, sinfonia,
máscara grega, magia,
que é retorta de alquimista,
mapa do mundo distante,
rosa-dos-ventos, Infante,
caravela quinhentista,
que é cabo da Boa Esperança,
ouro, canela, marfim,
florete de espadachim,
bastidor, passo de dança,
Colombina e Arlequim,
passarola voadora,
pára-raios, locomotiva,
barco de proa festiva,
alto-forno, geradora,
cisão do átomo, radar,
ultra-som, televisão,
desembarque em foguetão
na superfície lunar.
Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida,
que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança.
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O LIVRO
Devorei o livro numa só noite…
Tenho uma vaga ideia que foi numa noite de inverno daquelas que nos gelam as mãos, o nariz e todo o nosso corpo não revestido.
De quando em vez pousava o livro para esfregar as mãos, na vã tentativa de as aquecer.
De novo, com plena atenção ao livro, desprendia-me do meu corpo, ausentava-me do meu quarto e o frio que sentia era substituído pelo calor abrasador descrito no meu livro.
O sono, esse perdia-se no imenso espaço do meu quarto, e se porventura alguém me observava, alguém num mundo paralelo ao meu, tenho a certeza que via as emoções estampadas no meu rosto.
Se o momento exigia tristeza, ficava triste e uma lágrima solitária rolava pela minha face…
Se o momento era de alegria, nos meus lábios alguém pintava a cores um sorriso único…
E, assim, fiz muitas directas, isto é, saí do meu sono profundo sem nunca ter adormecido.
E com o vigor natural dos meus dezanove anos ia trabalhar com enorme satisfação.
Porque será?
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MUDANÇA
Preciso urgentemente de uma mudança na minha vida
Uma mudança que me liberte desta apatia diária...
Nem as férias conseguiram me acalmar o espírito e renovar energias
O ciclo escolar está a iniciar e mais do que nunca devo estar apta
Apta ás necessidades familiares, profissionais, domésticas, etc....
O meu mundo está em decadência
E figuras femininas feitas á minha imagem
Desenhadas ao sabor do vento
figura mulher
figura mãe
figura amiga
figura filha
Estão sufocadas, aprisionadas
Num mundo pequeno...
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LUCIANO PAVAROTTI
O tenor italiano Luciano Pavarotti, 71 anos, morreu hoje de madrugada em sua casa, em Modena, Itália, após uma longa luta contra um cancro no pâncreas.
U2/LUCIANO PAVAROTTI - MISS SARAJEVO
A minha singela homenagem a Luciano Pavarotti....