SOLIDÃO
Pavel Filonov,
com visões labirínticas inspiradas na Rússia medieval
Fugindo por momentos escassos de vida
Aproveito uma pequena distracção
Nos olhares curiosos dos outros
Escondo-me em mim
Fecho-me num imenso mar
Liberto-me em pleno no mundo submerso
Aquele que só a mim me pertence
Todos lutam
Não por um lugar ao sol
Mas um espaço na terra
Eu só quero para mim
Uns poucos momentos de solidão
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WALT WHITMANN
Canto de mim mesmo
As casas e os quartos estão repletos de perfumes, as prateleiras estão repletas de perfumes, Eu próprio aspiro essa fragrância, conheço-a e gosto dela, Eu próprio dela poderia embriagar-me, mas não o permitirei. A atmosfera não é um perfume, não sabe a emanação alguma, é inodora, Para sempre ficará na minha boca, por ela me apaixonei, Irei ao rio junto ao bosque e despojar-me-ei de disfarces e roupas, Estou louco por entrar em contacto com ela. O fumo da minha própria respiração, Ecos, ondulações, murmúrios e sussurros, raiz do amor, fio de seda, forquilha e vide, A minha respiração e inspiração, o bater do coração, o sangue e o ar que passam pelos meus pulmões, O odor das folhas verdes e das folhas secas, da praia e das rochas escuras do mar, e do feno no celeiro, O som das palavras que a minha voz atira aos remoinhos do vento, Alguns beijos leves, alguns abraços, os braços à volta de um corpo, O jogo de luz e sombra nas árvores com os dóceis ramos balouçando, O prazer de estar só ou no tumulto das ruas, ou pelos campos e colinas, A sensação de saúde, os gorjeios do grande meio-dia, o meu canto ao levantar-me da cama e encontrar o sol. Achas que mil acres são muitos? Achas que a Terra é muita? Praticaste o necessário para aprender a ler? Sentiste-te orgulhoso por captar o sentido dos poemas? Fica comigo este dia e esta noite e possuirás a origem de todos os poemas, Possuirás o que há de bom na Terra e no Sol (há milhões de sóis) Não terás coisas em segunda ou terceira mão, nem verás pelos olhos dos mortos, nem te alimentarás dos espectros dos livros, Nem através dos meus olhos verás, nem de mim terás as coisas, Escutarás tudo e todos e tudo em ti filtrarás. Tradução de José Agostinho Baptista |